Recentemente, tive a oportunidade de
conversar e refletir juntamente com o(a)s jovens estudantes do Colégio
Imperatriz Leopoldina, dos 6ºs, 7ºs, 8ºs e 9 ºs anos do Ensino Fundamental e com alguns pais e responsáveis,
a partir do convite feito pela direção e acompanhamento da coordenação deste
colégio para retomar os encontros chamados de “Rodas de Conversa”.
Por conta da pandemia e do afastamento
presencial das atividades escolares, acadêmicas, profissionais e sociais, o
trabalho de escuta e expressão possibilitado pelas “Rodas de Conversa” havia
sido temporariamente suspenso, e neste momento, por conta das questões que
surgiam na escola, de conflitos, agressividade verbal, bullying, entre outros,
a retomada das “Rodas de Conversa” mostrava-se importante. O intuito neste
momento era abordar as emoções e falar um pouco sobre comunicação,
relacionamento e empatia.
Deixando claro aqui, que de maneira
geral, o retorno presencial às aulas foi um desafio nacional e, relatos tanto
em escolas da rede pública, como privadas apontam para um reaprender e
replanejar a estar em sala de aula, com colegas, professores, coordenadores.
Tivemos muitas perdas com a pandemia, tanto físicas, emocionais, educacionais,
pessoais, familiares, profissionais, sociais, relacionais...e tais ainda estão
sendo processadas, elaboradas ou, talvez, vazadas, exageradas, manifestadas
inadequadamente, descontroladas, nos corpos e mentes infanto-juvenis. Precisam
de um espaço de expressão, de escuta, de acolhimento, para serem contornadas,
orientadas, ressignificadas, elaboradas...no tempo, forma e medidas, coletivas
e singulares de suas apresentações.
Iniciávamos a roda de conversa com a
frase de Antoine de Saint-Exupéry: “Tu te tornas eternamente responsável por
aquilo que cativas”, como forma de refletir como estávamos cativando um ao
outro. Em casa, na escola, no clube, nos eventos...fazíamos isto de forma
positiva ou negativa? Criávamos vínculos positivos ou negativos? Tínhamos
consciência da marca e impressão, positiva ou negativa, que deixávamos em
nosso(a)s colegas? Sabíamos que, provavelmente, continuaríamos a nos relacionar
com tais colegas por mais 2, 3, 4, 5 anos escolares, dentro do CIL e
voltaríamos a nos encontrar em outros ambientes, eventos sociais, na faculdade,
na vida profissional e social, no futuro? Qual responsabilidade tenho na forma
como trato e sou tratado por meus colegas e semelhantes?
E neste momento também introduzia
algumas noções básicas da neuropsicologia em relação ao funcionamento de nosso
cérebro, dos hemisférios cerebrais, um lado mais racional, outro mais emocional.
O equilíbrio e desequilíbrio, descompensação que certas situações poderiam
causar. O estresse, a perturbação, as emoções que tomam conta do corpo, e
muitas vezes, de forma impulsiva, nos fazem agir de maneira exagerada,
inadequada, socialmente negativa. A boa notícia é que podemos reparar situações
e buscar alternativas para lidar melhor com dificuldades e conflitos.
Para aprofundar a temática, também foi
indicado o filme Divertida Mente (2015), animação com direção e roteiro de Pete
Docter - Pixar e Disney.
A maioria dos alunos que participaram
desta roda de conversa conhecia ao filme “Divertida mente” e o livro “O pequeno
Príncipe”. Isto já facilitou nossas interações, exemplos e identificação por
parte do(a)s jovens.
Sabemos já há algum tempo da importância
da apresentação, diferenciação, ensino, desenvolvimento das habilidades
socioemocionais, assim como a sua adequada expressão e externalização emocional
em crianças e adolescentes. Quando uso o tempo “adequada” aqui, me refiro
àquilo que está em voga em nosso meio social – somos seres sociais e, como tais
seguimos normas, regras, adaptações, propostas e praticadas no e pelo meio
social. Por isto, esta temática está sendo abordada em escolas e instituições
sociais. É uma forma de autoconhecimento, auto desenvolvimento, vinculação,
atuação, comunicação, e consciência de si no tecido e meio sócio cultural.
Dentre os benefícios das competências
socioemocionais, podemos destacar a promoção da saúde mental e a melhor adaptação
ao meio sociocultural. Para tal é
importante, entre outros, o reconhecimento e diferenciação da dor, sofrimento,
emoções e sentimentos para o melhor desenvolvimento de estratégias para lidar
com situações tanto cotidianas, corriqueiras como àquelas mais difíceis e
delicadas.
Na psicologia transpessoal, falamos, por
exemplo, de quatro emoções básicas: Raiva, Medo, Tristeza e Alegria. Outras
escolas vão abordar outras categorias como: raiva, medo, tristeza, alegria e
nojo. Ou ainda incluir a surpresa entre estas 5.
Destas 4 emoções básicas aqui nomeadas,
duas são ativas: Raiva e Alegria. Duas são passivas: Medo e Tristeza. Todos nós as temos, manifestamos e somos
afetados por estas emoções. Em algum momento, estas se farão presentes em nossa
vida, em maior ou menor intensidade. Por vezes, a intensidade e forma de
expressão são consideradas inadequadas e até mesmo perigosas. Isto porque certas
emoções nos afetam e tomam o nosso corpo, nos fazendo agir impulsiva ou
inconsequentemente. Não raro, não conseguimos descrever o ocorrido, vivenciando
um misto de culpa, descontentamento e sensação de estarmos perdidos (as). Mal-entendidos,
desentendimentos e conflitos surgem disto. Ou situações mais graves, onde o
descontrole emocional pode causar consequências sérias pessoais e envolver
pessoas próximas.
Tais exemplos apontam para nossa
maturidade e/ou imaturidade emocional para lidar com tal ou qual situação.
Somos seres incompletos e em desenvolvimento; inclusive socioemocional.
Quando somos estimulados a pensar no que
aconteceu, como aconteceu e quais os efeitos disto a curto e longo prazo
começamos a perceber, reconhecer e administrar melhor estas manifestações em nós
mesmos e em nosso entorno. Observação, nomeação, externalização e percepção
interna são muito estimuladas por exemplo no trabalho psicoterapêutico. Agora
também estamos estimulando este recurso, ferramenta em ambientes educacionais.
Na psicoterapia, por exemplo, sabemos
que se nosso(a) cliente consegue se autoperceber, falar sobre, refletir e
externalizar suas emoções e sentimentos começa a ter maior percepção corporal,
consequência, consciência e auto responsabilização. Isto o torna mais maduro e
preparado para os desafios e dificuldades que ocorrerão no dia a dia em uma
megalópole como São Paulo.
É uma forma de lidar melhor com os
limites que o cotidiano nos impõe, com as frustrações advindas do meio externo,
dos relacionamentos e vínculos que mantemos e da dor trazida por algumas
situações para as quais ainda somos incapazes e imaturos. Saber perceber as
emoções, conhecer seus caminhos em nosso corpo e ser, nomeá-las e vivenciá-las
conscientemente nos traz inteligência emocional e maturidade interpessoal.
É um percurso colorido, por vezes
dolorido, de autoconhecimento e autodesenvolvimento – para melhor lidar comigo
e com o todo que me envolve, complementa, sustenta e intercambia.
Conforme reflexão feita por Thomas Hübl: “Cuanto más profunda se ala relación que soy capaz de crear conmigo
mismo tanto menos tengo que proyectar mis problemas fuera”, estamos
trabalhando com seres humanos. Frágeis, delicados, imperfeitos, faltantes. Acredito
que quanto mais consciente o ser for de suas limitações, manifestações,
relações e possibilidades, mais responsável e cuidadoso será consigo e com o
outro.
Na roda de conversa, abordamos também os
conceitos de simpatia, antipatia e empatia. O vínculo e a forma de relação que
estabelecemos com o outro. O descuido ou
o cuidado com o outro. O cuidado consigo. Posso até não simpatizar com algo.
Posso ter minhas opiniões divergentes, mas isto não significa que eu possa agir
de maneira agressiva, violenta ou intempestiva com tal. Respeitar o outro em
sua diferença e características próprias. Dar espaço e, respeitar, sem atacar. A
importância de empatizarmos com nossos colegas, com jeitos, formas e culturas
diversas. Ter empatia com nossa comunidade, com o que nos envolve para
sentirmos, saber o que sentimos e fazer algo, manifestar algo, conscientemente,
daquilo que nos toma, habita e move.
Conceituando Empatia:
1.faculdade de compreender
emocionalmente um objeto e ou situação (um quadro, uma escultura, uma foto, um
filme).
2.capacidade de projetar a personalidade
de alguém num objeto, de forma que este pareça como que impregnado dela.
3.capacidade de se identificar com outra
pessoa, de sentir o que ela sente ou poderia estar sentindo, de apreender do
modo como ela apreende etc.
Para
psicologia: processo de
identificação em que o indivíduo se coloca no lugar do outro e, com base em
suas próprias suposições ou impressões, tenta compreender o comportamento do
outro.
Para
sociologia: forma de
cognição do eu social mediante três aptidões: para se ver do ponto de vista de
outrem, para ver os outros do ponto de vista de outrem ou para ver os outros do
ponto de vista deles mesmos
Verifiquei novamente que o(a)s jovens
estão abertos ao diálogo e troca. Cada um à sua maneira e compasso. Alguns mais
agitados e inquietos que outros. Outros quietos demais. Como se manifestam? O
que demonstram e denunciam com seu comportamento? O que precisam? Este é o desafio de educadores, pais e
terapeutas. Os jovens têm muitas dúvidas e estão maravilhados com o mundo que
se mostra à sua frente. Têm um jeito e maneira própria de falar, vestir,
sentir, expressar. Busco formas de entrar em conexão e troca com ele(a)s. Com
sua linguagem e forma de apreender a cultura e meio social. É fundamental fazer
algumas apresentações em relação à este mundo que se mostra para ele(a)s. Não
que a vida tenha manual de instruções. Mas buscar possibilitar a conversa,
troca, reflexão, problematização, debate é essencial para amadurecer este
percurso e desafios pela vida. Fazer orientações, contar experiências,
questionar e se permitir ser questionado e escutar o que floresce disto.
Afinal, todos temos um corpo, aos poucos fomos aprendendo e nos habituando ao
mesmo...nunca totalmente, pois ele nos surpreende. Desta surpresa, deste novo,
eu crio. E junto com o outro, co-crio.
Ao final das rodas de conversa, foi
apresentado aos jovens o Chart Neuro
linguístico, o qual todos receberam uma cópia e levaram para casa. O Chart
é um recurso da Programação Neurolinguística para “recalibrar” o cérebro.
Auxiliar na concentração, acalmar e observar de forma mais atenta, ciente seu
corpo e os processos corporais, inclusive as emoções e sentimentos. Aprendi o
mesmo com meu psicoterapeuta e este me contou que este recurso havia sido
desenvolvido por pesquisadores da NASA para auxiliar os pilotos e profissionais
nos testes e treinamentos extremamente difíceis pelos quais passavam.
Contei aos jovens que os antigos nos
ensinavam a não tomar decisões de “cabeça
quente” ou “contar até 10 e respirar
para se acalmar” – é um princípio parecido - mas neste caso envolve o
corpo, fala e concentração da pessoa que executa o exercício, levando-a a outro
estado mental e emocional. É um exercício psicomotor. Por trabalhar lados
opostos do corpo, o movimento e a fala concomitantemente, atua sobre os
hemisférios direito e esquerdo do cérebro, levando a um estado mais calmo,
equilibrado e, divertido. É um exercício lúdico e desafiador.
A pessoa se posiciona em pé de frente
para a folha do Chart. O Chart é um alfabeto, que será lido em voz alta pela
pessoa e, abaixo de cada letra do alfabeto, há 3 letras menores (d, e, j) que
correspondem a movimentos corporais. Enquanto a pessoa entoa o alfabeto em voz
alta, executa os movimentos correspondentes a cada letra. As letras pequenas
equivalem a (d)ireita, (e)squerda e
(j)untos – que são os movimentos do corpo, ora mais à direita, ora mais à
esquerda, ora juntos.
Em cada grupo um aluno ou aluna foi
selecionado para demonstrar o exercício e verificar se o ou a mesmo(a) validava
os efeitos calmantes, divertidos e diferenciados após a execução do mesmo.
Sugeri que todos utilizassem o chart para fazer suas tarefas escolares, antes
de estudar para provas, antes de provas, antes de ensaios, de apresentação, antes
ou após um desafio ou momento de tensão, brigas, desentendimentos – para sentir
o corpo, os comportamentos, as sensações, os pensamentos, as
emoções...nomeá-las e, aprender com estas. Sugeriu-se também que mostrassem aos
professores, coordenadores e fizessem em conjunto – pois é para ser um recurso
útil e, divertido, para todos. Alguns professores estiveram presentes durante a
roda de conversa e treinaram, exercitaram o Chart junto com alunos e
psicoterapeuta. A coordenadora Ruth Nassif esteve presente em diversas das
Rodas de Conversa e verificou que diversos alunos fizeram o Chart após a roda
de conversas. Achei importante, além do espaço de expressão e escuta, poder
oferecer um recurso útil para os jovens em seu dia a dia.
A reflexão final da roda de conversas
segue:
“Ninguém
nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por
sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a
odiar, elas podem ser ensinadas a amar.” Nelson Mandela
Agradeço à direção e coordenação do Colégio
Imperatriz Leopoldina pela abertura, confiança e parceria neste trabalho
delicado e essencial. Aos pais e alunos pela presença e possibilidade de troca,
reflexão, debate e, sempre, aprendizado!
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